sexta-feira, 11 de junho de 2010

Cinema: Wendy e Lucy - uma Amizade sem Limites

Há quem considere os cães milagres com patas e quem garanta que um cão - mais que qualquer outro animal de estimação -, por ignorar os erros do dono será o seu único laço de afecto garantido, acima de qualquer julgamento.
Não precisamos de ser tão eloquentes ou extremistas para elogiar o filme que levou a realizadora Kelly Reichardt a arrecadar o Prémio da Crítica de Toronto. Mas ambos os ditos traduzem bem a linha fundamental da história simples e tocante que agora estreia nos cinemas:
Wendy é uma rapariga de ar desembaraçado, cara de Maria-rapaz que deixou a sua terra e cruza as ruas de Oregon em direcção ao Alasca, não se sabe exactamente porquê, mas imagina-se para quê: começar uma vida nova. Sabe-se que para trás deixou uma irmã e um cunhado pouco preocupados consigo, que viaja num carro em mau estado mas, sobretudo, que viaja com uma cadela, Lucy.
Tal como a dona, Lucy mistura um olhar doce e frágil com uma atitude decidida. As duas, torna-se rapidamente claro, são o único genuíno laço de afecto uma da outra. Depois de deitar contas à vida e ao pouco dinheiro que lhe resta, Wendy trata de arranjar comida para ambas num supermercado. É ao sair, sem nada para si mas com comida para Lucy, que a dona dá por falta dela.
Desamparada, Wendy empreende a partir de então uma incessante busca pela cadela, conduzindo-a a caminhos e decisões inesperados...
Longe do registo de aventura em que se inscrevem as mais ternurentas e populares histórias de amizade entre seres humanos e animais, a maioria feitas para crianças, "Wendy e Lucy" é um curioso reavivar de um certo género de cinema já invulgar: drama simples, com forte componente social, minimalista, quase se confundido com documentário.
O seu despojamento cinematográfico, que tem tudo a ver com as personagens centrais, poderá não agradar a todo o tipo de público, sobretudo porque dispensa um clímax e uma decoração num género narrativo a que estamos demasiado habituados. Tal não o impede de ser um belo filme, pelo contrário: reeduca-nos o olhar perante um certo cinema e, sobretudo, certas personagens que estão longe de se resumir ao outro lado do ecrã.

Margarida Ataíde
In
Agência Ecclesia

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